Poemas metrificados ( na sua maioria ) para Fado.

Já nada me surpreende

Já nada me surpreende / Nem mesmo um cão a fumar
Ou um gato a controlar / O peixe que a lota vende

Um cachorro, um gato bravo / Uma botija de gaz
Armas letais dum escravo / Que diz não e tudo faz

Um martelo, um parafuso / Uma lima e um serrote
Ferramentas que não uso / Nem à força de chicote

Um chapéu, uma camisa / Umas botas militares
São coisas p’ra quem precisa / Mudar rotinas e ares

Uma sachola, um arado / Uma picareta forte
E a farda dum soldado / Que maldiz a sua sorte

Uma nave espacial / Um belo submarino
Coisas de bem e de mal / Que vão mudando o destino

Um torpedo velocista / Uma bomba dirigida
Atentado terrorista / Roubando à vida mais vidas

Uma casa sem qua a porta / Abra quando a gente quer
Uma paixão quase morta / Abraçando o bem-querer

Uma folha de papel / Tão banca quanto é a cal
Um frasco cheio de mel / Feito de fel e de sal

Uma viagem a pé / Ao centro da gravidade
Uma taça de café / Com o travo da saudade

Uma ponte derrubada / Sem ligação nem saída
Uma história mal contada / E muito bem escondida

Um filho que recupera / O amor dum pai tirano
Uma festa que s’espera / Mas só lá pró fim do ano

Uma mente conspurcada / Uma língua meio solta
Uma estrada prolongada / Por onde vai quem não volta